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Goalball

Goalball

O goalball foi criado em 1946 pelo austríaco Hanz Lorezen e o alemão Sepp Reindle, com o objetivo de reabilitar veteranos da Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945) que perderam a visão durante esse terrível confronto. Porém, foi somente em 1985, quando Steven Dubner, americano radicado no Brasil, trouxe a primeira bola de goalball que a modalidade começou a se desenvolver por aqui. A história de Dubner na verdade transcende o goalball e se confunde com a evolução do paradesporto no Brasil, especialmente em São Paulo. Formado em Educação Física pela Faculdades Integradas de Santo André (FEFISA), Dubner começou dando aulas de basquetebol em um clube da capital paulista. Foi quando, no início dos anos 1980, foi procurado por um cadeirante e questionado se era possível para ele praticar o basquetebol em cadeira de rodas.

Apesar da modalidade já ter adeptos no Brasil desde os anos 1950, Steven nada sabia sobre paradesporto. Mas só até aquele dia. Curioso, com grande espírito empreendedor e aventureiro, começou a se envolver com esse universo. Em 1984, passou a treinar o time de basquetebol em cadeira de rodas do Clube dos Paraplégicos de São Paulo (CPSP), além de se envolver com atletismo e natação, que engatinhavam no país, naquela época. Nesse mesmo ano, foi como um dos técnicos da delegação brasileira nas paralimpíadas, que aconteceram em Nova York (EUA) e Stoke Mandeville (Inglaterra). Na Inglaterra competiram os atletas em cadeira de rodas e nos EUA os com outras deficiências. ”Tudo era muito precário no Brasil nessa época, trouxe 12 cadeiras de rodas de basquetebol para competições, mas banquei do meu bolso. Arrumar patrocínio para atletas com deficiência era tarefa quase impossível”, conta ele.

Nesse mesmo ano, Steven ajudou a fundar o Centro de Apoio ao Deficiente Visual (CADEVI), passando a interagir diretamente com a deficiência. “Procurei o Instituto Padre Chico e falei do CADEVI, para divulgarmos entre os alunos de lá. Primeiro apareceram uns dez, depois vinte, depois cinquenta, o negócio foi tomando corpo”, fala Dubner com satisfação. Foi nesse contexto, no ano de 1985, que Steven foi aos Jogos Mundiais de Cegos e conheceu o goalball. “Achei muito interessante e, de imediato, tive como objetivo iniciar a divulgação da modalidade pelo país”, diz Dubner, que é palestrante e fundou, em 1996, a Associação Desportiva para Deficientes (ADD), em conjunto com Eliane Miada. Miada até hoje está no comando da ADD, com destaque para o time de basquetebol em cadeira de rodas, o Magic Hands, além de outras inúmeras atividades oferecidas pela instituição (ver capítulo História). Voltando ao ano de 1985, uma das primeiras pessoas que Steven procurou foi o professor Mario Sérgio Fontes (ver capítulo do Futebol de 5), talvez a principal figura histórica do paradesporto para atletas com deficiência visual no Brasil, pelo seu pioneirismo. “Mario é de Curitiba (PR), e já estava na presidência da Associação Brasileira de Desporto para Cegos (ABDC). Ninguém melhor que ele para ajudar na expansão da modalidade”, conta Steven. Fontes, à época, travava embate com o Conselho Nacional do Desporto (CND), que havia determinado, de forma autoritária, que todas as modalidades voltadas a cegos no país fossem coordenadas pelo Instituto Benjamin Constant, do Rio de Janeiro. “Tínhamos fundado a ABDC em 1981, mas era como se ignorassem sua existência. O Instituto Benjamin Constant, apesar de voltado a pessoas com deficiência visual, é dirigido por videntes. Entidades de cegos pelo Brasil se rebelaram e a ABDC voltou a ter a autonomia que sempre quis ter”, afirma Mario Sérgio. Com essa mesma determinação, passou a ajudar Dubner na divulgação da modalidade.

Foi em 1986, quando Mario Sérgio foi ao Mundial de Goalball, que o jogo realmente ficou conhecido, nos seus detalhes, com regras, técnicas, táticas e tudo o mais. “Steven tem participação decisiva no aparecimento do goalball por aqui, mas ele desconhecia os pormenores do jogo. Só fomos ficar sabendo desses detalhes durante o Mundial, que foi na Holanda”, explica Mario Sérgio. Em 1987, já ocorreu o primeiro Campeonato Brasileiro da categoria. O CADEVI já estava nesse campeonato (aliás, o CADEVI começou a participar de campeonatos desde 1985, evidenciando seu pioneirismo na modalidade), em que conquistou a 3ª colocação. A instituição ainda participaria de campeonatos até 1997. Destaque para os vice-campeonatos nacionais de 1992 e 1993. A modalidade é de fácil execução e entendimento, o que facilitou sua expansão. Mas o boom pelo país começou mesmo quando o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) foi criado, em 1995. A fundação do CPB trouxe recursos financeiros e a possibilidade de orçamentos específicos para cada modalidade paralímpica.

Com isso, as entidades de atletas com deficiência visual pelo país foram se fortalecendo, campeonatos estaduais, regionais e nacionais foram sendo montados e hoje a modalidade está presente em todos os estados da Federação, sendo que São Paulo é a grande força. São disputados pelo Brasil campeonatos organizados pela Confederação Brasileira de Desporto de Deficientes Visuais (CBDV), que substituiu a antiga ABDC em 2010. Temos vários regionais, entre eles o Regional Sul, Regional Centro-Norte, Regional Nordeste, Regional Sudeste I e Regional Sudeste II, sendo esse último destinado exclusivamente a instituições paulistas, tamanho o número de equipes no Estado que praticam o goalball. Esses regionais classificam para a Copa Caixa Loterias de Goalball, o campeonato nacional da categoria que, na edição de 2015, contou com 14 equipes. Existe uma federação paulista da modalidade, a Federação Paulista de Desporto para Cegos (FPDC), que também engloba as modalidades de atletismo, futebol de 5, judô, natação e xadrez. Para se ter uma ideia, o Campeonato Paulista masculino de goalball foi disputado por 8 equipes em 2015, apenas contando a fase final. Participaram da competição: Sesi de Mogi das Cruzes; ADVVALE, de Taubaté; Santos Futebol Clube, de Santos; CESEC, de São Paulo; Instituto Athlon, de São José dos Campos; CIADEVA, de Taboão da Serra; APADV, de São Bernardo do Campo e o Lar das Moças Cegas, de Santos. Na categoria feminina, mais quatro equipes: Sesi de Mogi das Cruzes; Instituto Athlon, de São José dos Campos; APADV, de São Bernardo do Campo e o Lar das Moças Cegas, de Santos. A semente, ou a bola, que Dubner trouxe em 1985 germinou e vem gerando frutos. Uma das atletas da seleção brasileira, a paulistana Simone Camargo, 39 anos, experimentou muito da evolução da modalidade. Simone nasceu com glaucoma e tinha apenas 10% de visão nos olhos quando levou uma bolada em brincadeira com amigos, aos 12 anos, e ficou cega.

Seis anos depois, conheceu um amigo que lhe falou do Centro de Emancipação Social e Esportiva de Cegos (CESEC). “Eu frequentei na minha infância o Instituto Padre Chico, mas depois só estudei em escolas regulares. Foi na época em que cursava o Ensino Médio que me falaram do CESEC”. Lá conheceu várias modalidades esportivas, mas foi o goalball e o atletismo que conquistaram seu coração. No atletismo, Simone disputou duas paralimpíadas, em Atenas 2004 e Londres 2012, em que fez duas finais paralímpicas nos 200 metros rasos, alcançando o 5° lugar em 2004. No goalball, ela defendeu primeiro o time do CESEC, para depois se mudar para Maringá (PR), e jogar pelo time da ADEVIMAR, onde permaneceu entre 1996 e 1999. Depois voltou para o CESEC onde ficou até 2006. Entre 2007 e 2012, foi atleta da APADV, de São Bernardo do Campo. Em 2013, foi para o Sesi, onde permanece até hoje. Nessa peregrinação, conquistou nada menos do que dez campeonatos brasileiros, sendo um com o Sesi, três com a APADV, dois com a ADEVIMAR e quatro com o CESEC. “Minhas atuações acabaram me levando à Seleção Brasileira muito cedo, minha primeira convocação foi em 1995. Mas, nessa época, minha vida estava uma loucura, eu me dividia entre o goalball e o atletismo. Comecei a trabalhar, depois me casei (tem um filho de 7 anos, Thiago), era tudo muito intenso, bem corrido. Apesar de sempre ter jogado goalball, não fui convocada para a seleção por um bom tempo. Só voltei em 2001, quando se iniciava o ciclo de Atenas. Nesse ano fomos bronze no Parapan dos EUA (Carolina do Sul), foi a primeira medalha internacional do goalball feminino”, conta Simone, que é formada em Psicologia pela Faculdade São Marcos, em mais uma prova de que os obstáculos existem para todos, mas basta procurar seu próprio caminho para conseguir qualidade de vida e o sucesso. Em 2002, participou do Mundial da categoria, promovido pela International Blind Sports Association (IBSA) que aconteceu no Rio de Janeiro, em que o Brasil ficou com o 6° lugar, mostrando já uma evolução técnica e tática incrível. Em 2003, novamente no Mundial da IBSA, a conquista da prata e a consequente vaga para Atenas. “Acho que nunca ficamos tão felizes, parecia que era o ouro. Ficamos contentes por perceber que estávamos no mesmo nível das grandes potências, além da vaga para a paralimpíada, é claro. Era a primeira vez que o Brasil conseguia esse feito”, diz Simone, que joga na posição de central (fixo). Em Atenas, acabamos em sétimo entre oito seleções, mas a experiência renderia frutos para a modalidade. Em 2007, quando ainda se dividia entre o atletismo e o goalball, fraturou o tornozelo direito na prova do salto em distância, nos Jogos Mundiais para Cegos. “Aquilo foi um divisor para mim, praticamente parei com o atletismo, fiquei só com o goalball. Voltei apenas em 2012, por seis meses, para conseguir vaga para Londres, porque no goalball não fui convocada”. Porém, antes disso, em 2008 (Pequim) estava novamente com a seleção, onde ficaram em 6° lugar. Depois da decepção de 2012, voltou a ser chamada em 2013, permanecendo no time até hoje. Em 2015, outra alegria sem tamanho. A conquista da medalha de ouro no Parapan de Toronto (Canadá), derrotando na final os Estados Unidos, simplesmente o país campeão mundial atual. “Isso foi incrível também, nos dá muita confiança para o Rio. Estamos em fase de treinamento intensivo, são várias etapas, em cidades diferentes. Mas estamos confiantes no pódio, mesmo sabendo que as maiores forças estarão aqui. Porém, hoje, temos consciência da nossa força no goalball mundial”.

O BRASIL NOS JOGOS PARALÍMPICOS

A Seleção Brasileira masculina conquistou uma medalha de prata no Parapan de Buenos Aires, em 1995, estreando a modalidade em pódios de competições internacionais. Na Carolina do Sul (EUA), em 2001, as mulheres conquistaram o bronze no Parapan, enquanto a seleção masculina ficou com o quarto lugar. Em 2003, as atletas brasileiras foram vice-campeãs no Mundial da IBSA, disputado em Quebec, no Canadá. Com isso, o Brasil se classificou para uma edição dos Jogos Paralímpicos pela primeira vez. Em Pequim 2008, foi a estreia da seleção masculina em uma edição dos Jogos Paralímpicos. No Parapan de Guadalajara 2011, a seleção feminina conquistou a medalha de prata e, a masculina, o ouro, o que resultou na classificação de ambas para Londres 2012. Nos Jogos Paralímpicos de Londres, a seleção masculina realizou o maior feito do goalball brasileiro, ao conquistar a medalha de prata. No Mundial disputado em 2014, na Finlândia, a seleção masculina sagrou-se campeã mundial pela primeira vez. Hoje o Brasil é uma das principais forças do goalball mundial, tanto no feminino, como no masculino.

FICHA TÉCNICA

Descrição e regras: O goalball é um esporte de equipe, disputado por dois times de três jogadores com, no máximo, três atletas reservas. Podem competir na mesma equipe atletas das classes B1, B2 e B3, segundo as normas de classificação da Federação Internacional de Esportes para Cegos (IBSA). O goalball é disputado nas categorias masculina e feminina. O jogo é disputado num espaço com as mesmas dimensões da quadra de voleibol, ou seja, 9 metros de largura e 18 de comprimento. No fundo de cada uma localizam-se duas balizas, que abrangem todo o comprimento da quadra, 9 metros de largura e 1,3 metros de altura. Os três atletas de cada equipe ficam restritos a uma área de 6 metros à frente da baliza que defendem, de modo que não há qualquer contato com os oponentes. Os atletas arremessam a bola para o outro lado, tendo como objetivo fazer com que ela ultrapasse o fundo da quadra adversária, entrando assim nas balizas. Em sua trajetória, a bola precisa obrigatoriamente tocar linhas predeterminadas, de modo que ela chegue ao gol adversário junto ao chão. A bola de goalball é especialmente desenvolvida para esse esporte e em seu interior possuí um guizo que balança durante seu deslocamento, permitindo que os atletas a localizem por meio da audição. A bola tem 76 cm de diâmetro e pesa 1,25 kg. Sua cor é azul. As partidas são disputadas em dois tempos de 12 minutos cada. Todo jogador deve, obrigatoriamente, utilizar venda oftalmológica durante as partidas, de modo que um atleta com visão parcial não obtenha qualquer vantagem. São duas as posições de jogadores: os alas, mais preocupados com o ataque, e o central, ou fixo, com maiores preocupações defensivas. Porém, todos os jogadores podem atacar ou defender. O goalball é um esporte baseado nas percepções tátil e auditiva, por isso não pode haver barulho no ginásio durante a partida, exceto no momento entre o gol e o reinício do jogo e nas paradas oficiais. Hoje, o goalball é praticado em 112 países dos cinco continentes. No Brasil, a modalidade é administrada pela Confederação Brasileira de Desporto de Deficientes Visuais (CBDV).

Classificação: Nesta modalidade, os atletas com deficiência visual das classes B1, B2 e B3, competem juntos, ou seja, do atleta completamente cego até os que possuem resíduo visual. Todas as classificações são realizadas por meio da mensuração do melhor olho e da possibilidade máxima de correção do problema. Todos os atletas, independentemente do nível de perda visual, utilizam uma venda durante as competições, para que todos possam competir em condições de igualdade.

•   B1: Cego total: de nenhuma percepção luminosa em ambos os olhos até a percepção de luz, mas com incapacidade de reconhecer o formato de uma mão a qualquer distância ou direção.

•   B2: Atletas que têm a percepção de vultos. Da capacidade em reconhecer a forma de uma mão até a acuidade visual de 2/60 ou campo visual inferior a 5 graus.

•  B3: Os atletas conseguem definir imagens. Acuidade visual de 2/60 a 6/60 ou campo visual entre 5 e 20 graus.