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História

História do movimento paralímpico no Brasil  e em São Paulo

A história do paradesporto no Brasil começa a partir de dois nomes: Robson Sampaio de Almeida e Sérgio Seraphin Del Grande. Antes deles as pessoas com deficiência não contavam com o esporte como ferramenta de inclusão social.

Foi com esse objetivo que Almeida fundou o Clube do Otimismo, em abril de 1958, no Rio de Janeiro, e Del Grande o Clube dos Paraplégicos de São Paulo (CPSP), em julho do mesmo ano.

Existem historiadores que discordam dessas datas e consideram o registro da ata da primeira reunião de cada clube como as datas oficiais do início de suas atividades. Nesse cenário, ambos teriam nascido no início de 1959, com uma diferença de três dias “a favor” do clube carioca.

Mas a prática mostra o contrário, tanto para o CPSP como para o Clube do Otimismo, já que existem relatos de atividades sendo realizadas ainda em 1958. Só para se ter uma ideia da importância de Sérgio Del Grande e do recém-fundado CPSP, quem comandou o evento de fundação da entidade foi Paulo Machado de Carvalho, que havia acabado de chefiar a delegação brasileira dona do primeiro título mundial do futebol brasileiro conquistado meses antes, na Suécia.

O próprio CPSP considera sua data de fundação como sendo 28 de julho de 1958, e a data não teria sido escolhida por acaso, já que nesse mesmo dia, em 1948, era fundada a Federação Internacional de Esportes de Stoke Mandeville, na Inglaterra, pioneira no esporte em cadeira de rodas.

Controvérsias à parte, o importante é que ambos plantaram uma semente que germinou, cresceu e se solidificou. Milhares de pessoas com deficiência pelo Brasil encontram hoje no esporte uma possibilidade, seja de lazer, seja para reabilitação, ou até mesmo como profissão.

Atletas de ponta são revelados continuamente, tornando o Brasil uma potência paralímpica, como mostra a campanha realizada na paralimpíada de Londres, em 2012, em que o país terminou em 7° lugar no ranking entre 165 nações competidoras, com 21 medalhas de ouro, 14 de prata e 8 de bronze.

A história do CPSP está intimamente ligada a Del Grande e ao basquetebol em cadeira de rodas (ver capítulo Basquetebol), pois foi essa a primeira modalidade esportiva adaptada que o Brasil começou a praticar. Nesses 58 anos de história, o CPSP ainda desenvolveu as modalidades de atletismo, basquetebol, bocha, esgrima, halterofilismo, natação e voleibol paralímpico, cada qual à sua época e com desenvolvimentos diferentes.

Quem vivenciou grande parte dessa história foi o atual presidente da entidade, João Bentim, que ficou paraplégico em 1984, após um acidente de carro. Em 1994, dez anos depois do acidente, Bentim começou a frequentar o CPSP. “A verdade é que os primeiros passos do paradesporto nacional e paulista foram feitos por abnegados, voluntários, simplesmente porque não havia dinheiro. A mentalidade dos anos 1950, e pelas décadas seguintes era de preconceito, e não apenas de pessoas. Empresas também tinham receio de ver seu nome ligado à gente “estranha”, sem braço, sem perna, cegas, surdas ou em uma cadeira de rodas. Para se ter uma ideia, no início das minhas atividades no CPSP, em 1994, os técnicos eram voluntários, e para organizar uma competição nossos atletas se uniformizavam e iam pedir dinheiro em semáforos. Não dá para imaginar isso nos dias de hoje”, conta Bentim.

No final dos anos 1970 e 1980, outras entidades foram sendo criadas, mostrando que o caminho trilhado até então por verdadeiros heróis ganhava corpo e forma. Uma delas foi a Associação Brasileira de Desportos para Cegos (ABDC), presidida por Mario Sérgio Fontes; a Associação Brasileira de Desporto em Cadeira de Rodas (ABRADECAR), presidida por José Gomes Blanco; a Associação Nacional de Desporto para Deficientes (ANDE), sob a presidência de Aldo Miccolis, apenas citando as principais (ver história do Comitê Paralímpico Brasileiro).

Porém, a grande virada desse cenário veio com a criação do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), em 1995. “A criação do CPB não apenas trouxe organização e planejamento como, e principalmente, motivou a entrada de recursos financeiros. A primeira grande iniciativa nesse sentido foi a Lei dos Bingos, que obrigava essas instituições a destinarem parte de sua arrecadação ao esporte convencional e também ao paralímpico”, diz Bentim.

Mas foi com o advento da Lei Piva, sancionada em 16 de julho de 2001, que tudo mudou definitivamente. Ela representou um marco para o esporte nacional, ao proporcionar um avanço na captação de recursos destinados ao desenvolvimento desportivo brasileiro. Essa lei prevê que 2% da arrecadação bruta das loterias federais em operação no país, descontadas as premiações, sejam destinados em favor do Comitê Olímpico do Brasil (COB) e do CPB, na seguinte proporção: 85% para o COB e os 15% restantes para o CPB.

A Lei Agnelo/Piva determina ainda que, do total arrecadado por essas instituições, 10% deverão ser investidos no desporto escolar e 5% no desporto universitário. Após a Lei Agnelo/Piva, as diversas confederações olímpicas e paralímpicas passaram a contar com uma renda perene para investir em projetos visando a preparação dos atletas e a participação nas mais diversas competições nacionais e internacionais, além da aquisição de equipamentos e da contratação de pessoal especializado, como treinadores e profissionais de alto gabarito, entre outras ações.

Mesmo nesse cenário altamente positivo, o paradesporto viveu suas crises, uma das principais em 2003, entre o CPB e a ABRADECAR. As rusgas foram tantas que a ABRADECAR deixou de existir anos depois. Foi nesse cenário que o CPSP passou a realizar um campeonato que englobaria as principais entidades esportivas voltadas aos atletas com deficiência no Brasil.

Nascia, então, o Troféu Sérgio Del Grande, com a primeira edição realizada entre os dias 26 e 28 de setembro de 2003, contando com provas de atletismo e natação. “Na verdade, houve uma grave crise financeira que envolveu as entidades voltadas aos atletas com deficiência física, muito por conta da briga política entre o CPB e a ABRADECAR. Nenhuma competição para esses atletas havia sido realizada até então, naquele ano, em território nacional. Foi a iniciativa do CPSP que proporcionou essa oportunidade única”, conta Bentim.

As provas aconteceram na pista de atletismo e na piscina do Complexo Desportivo Constancio Vaz de Guimarães, no Ibirapuera, em São Paulo. Nessas duas modalidades os participantes, atletas com deficiência física, intelectual e visual puderam, pela primeira vez naquele ano, aferir suas marcas num evento com locais e arbitragens oficiais.

A primeira edição do Troféu Sérgio Del Grande de Atletismo e Natação foi um sucesso e contou com a participação de mais de 300 atletas de norte a sul do Brasil. Os resultados do campeonato foram reconhecidos pelo CPB e serviram de parâmetro para convocação dos atletas que disputariam um campeonato que seria organizado pelo próprio CPB um mês depois, no mesmo local. Com o grande sucesso ocorrido na edição de 2003, muitos clubes e atletas de vários pontos do Brasil passaram a solicitar ao CPSP, organizador do evento, que fossem ampliadas as modalidades oferecidas no campeonato.

E assim, no período de 3 a 7 de setembro de 2004, foi realizado o II Troféu Sérgio Del Grande, em que foram disputados, além de natação e atletismo, halterofilismo, tiro paralímpico, tênis, bocha, polybat, tênis de mesa, voleibol paralímpico, tiro com arco e basquetebol em cadeira de rodas (esta última somente com jogos amistosos).

O evento ocorreu novamente no Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães (Ginásio do Ibirapuera) e no Clube da Cidade Ibirapuera. Com o passar dos anos, a competição foi se consolidando cada vez mais e, em 2015, foi realizada a sua décima primeira edição, com a participação de quase 800 atletas.

A importância do CPSP no paradesporto nacional e, consequentemente, no movimento paralímpico é de uma grandeza única. Foi a partir de sua fundação, e com o passar dos anos, que centenas de entidades foram fundadas e se desenvolveram no estado de São Paulo, proporcionando a pessoas com deficiência a prática do esporte. Muitas delas, como a Associação para Integração Esportiva do Deficiente Físico (CIEDEF), o Centro de Apoio ao Deficiente Visual (CADEVI), e o Centro de Emancipação Social e Esportiva de Cegos (CESEC), entre outras, estão mencionadas com mais detalhes nos capítulos desta publicação destinados às modalidades. O CPSP também firmou convênios com importantes entidades paulistas e brasileiras, como o Hospital das Clínicas (HC), a AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente) e as APAEs. Resultados que certamente encheriam de orgulho seu fundador, Sérgio Del Grande, falecido em 11 de maio de 2005.

COMITÊ PARALÍMPICO BRASILEIRO

Era o ano de 1975, no Rio de Janeiro, quando o professor Aldo Miccolis criou a Associação Nacional de Desporto para Deficientes - ANDE. O intuito da entidade era agregar os esportes praticados por atletas com todos os tipos de deficiência.

Com o passar dos anos, essa tendência sofreu ajustes e as deficiências e modalidades passaram a ser categorizadas. Assim, foram fundadas a Associação Brasileira de Desporto em Cadeira de Rodas – ABRADECAR (1982), a Associação Brasileira de Desporto para Cegos - ABDC (1984), a Associação Brasileira de Desporto de Deficientes Mentais - ABDEM (1986) e a Associação Brasileira de Desporto para Amputados - ABDA (1990).

Em 1988, pouco antes da paralimpíada de Seul, já existia uma tendência mundial para que cada país criasse o seu Comitê Paralímpico Nacional. Nesse cenário, as entidades supracitadas, com exceção da ABDA, que ainda não existia, instituíram o National Paralympic Committee - Brazil (NPC - Brasil). Faziam parte da entidade representantes da ABDC, ABRADECAR e ANDE, além de um membro da Secretaria de Educação Física e Desportos do Ministério da Educação (Seed-MEC) e outro da Coordenação Nacional para Integração da Pessoa Deficiente (CORDE), essa última representada pelo professor Vanilton Senatore, outra figura importante ligada ao paradesporto nacional, desde 1974, quando saiu de São Paulo e passou a atuar em Brasília, Distrito Federal.

Com a fundação do Comitê Paralímpico Internacional (IPC), em 1989, essa tendência só se reforçou, mas o Brasil já tinha se adiantado nesse sentido, como descrito. A formação dos NPCs se tornava urgente, pois o IPC precisava ter como filiadas entidades com representatividade em nível nacional e que agregassem modalidades para pessoas com todos os tipos de deficiência. A partir de 1993, a ideia de criar um Comitê Paralímpico no Brasil começou a tomar corpo. Essa nova entidade substituiria o NPC – Brasil, estabelecido em 1988.

Diante dessa tendência, representantes das entidades já mencionadas, e ainda a ABDA, se reuniram e fundaram o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), em 9 de fevereiro de 1995, com sede na cidade de Niterói, Rio de Janeiro. João Batista de Carvalho e Silva foi o primeiro indicado à presidência da entidade. João Batista, cuja esposa, Tânia Rodrigues, contraiu poliomielite aos 3 anos de idade, tornando-se cadeirante foi um dos fundadores da ABDA e quem introduziu o futebol para amputados no país. “Foi um período bem difícil enquanto estava na presidência do CPB, faltava dinheiro para tudo. O jeito era bater na porta de empresas, estatais e privadas, na busca por recursos”, conta João Batista.

Uma alternativa era tentar a aprovação de projetos via governo federal, por meio do Ministério do Esporte. “Nesse caso, conseguíamos verba para custeio de torneios nacionais e ainda para viagens internacionais, tentando incrementar o intercâmbio com países de ponta no paradesporto. Mas não havia dinheiro para treinamentos, por exemplo, esses ficavam a cargo das entidades espalhadas pelo país”, relata João Batista.

Eventos públicos com participação de artistas, celebridades e formadores de opinião também ajudaram a divulgar a causa paralímpica. “Organizamos eventos em locais como a praia de Copacabana, convidando personalidades da época, como Dedé Santana e Angélica. Além disso, em 1996, em Atlanta, o então ministro Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, acompanhou a delegação durante os jogos, emprestando seu nome e prestígio à causa. Levamos também uma delegação de jornalistas, para que divulgassem os jogos e a causa paralímpica aos brasileiros. Foi um período difícil, mas gratificante. Com a Lei Piva tudo ficou mais fácil, mas aí eu não estava mais lá”, conta João Batista.

Mesmo enfrentando uma série de dificuldades e com pouco tempo de existência, o CPB começou a colocar em prática uma de suas principais funções: a organização de eventos paralímpicos nacionais para o desenvolvimento do esporte no país. Ainda em 1995, no ano de sua fundação, organizou os I Jogos Brasileiros Paradesportivos, em Goiânia. A segunda edição da competição foi realizada no Rio de Janeiro, no ano seguinte, já com foco na proximidade da paralimpíada de Atlanta 1996.

Com o passar dos anos, o CPB passou a contribuir progressivamente para o fomento ao esporte de alto rendimento para pessoas com deficiência. Dentre as iniciativas estavam desde a divulgação e organização de competições, até o envio de atletas para eventos no exterior, com o intuito de proporcionar a experiência esportiva. Essas ações surtiram o efeito esperado durante a paralimpíada de Sidney 2000, quando o Brasil ficou em 24º lugar no quadro de medalhas, após a conquista de 6 ouros, 10 pratas e 6 bronzes. Na Austrália, a delegação nacional era composta por 64 competidores.

Em 2001, ocorreram novas eleições do CPB. Foi eleito presidente Vital Severino Neto, cujo mandato após a reeleição durou até fevereiro de 2009. Graduado em Direito, ex-atleta paralímpico e secretário-executivo da primeira gestão do CPB, Vital, cego desde a infância, foi a primeira pessoa com deficiência a assumir o comando da entidade. No dia 19 de junho de 2002, a sede do CPB foi transferida de Niterói, no Rio de Janeiro, para Brasília, no Distrito Federal. A medida foi tomada com o intuito de colocar a entidade máxima do esporte paralímpico nacional na cidade que é o centro das decisões políticas do Brasil, além de estar mais próxima do Ministério do Esporte.

Nesse mesmo ano, o CPB passou a seguir o modelo internacional, priorizando as modalidades e não as deficiências. Ou seja, não importava se o atleta era cego ou cadeirante, mas sim qual a modalidade que praticava. A destinação dos recursos por modalidade acabou com a sobreposição de papéis e houve um ganho em escala, as confederações passaram a receber mais investimentos e puderam organizar melhor sua gestão e distribuição.

Sob o comando de Vital, o Brasil fez ótima campanha nas paralimpíadas de Atenas, em 2004. O evento representou uma nova fase do país na competição. Até então, a melhor campanha havia sido o 24º lugar em 1984, nos Jogos de Nova York e Stoke Mandeville, quando o país conquistou 7 ouros, 17 pratas e 4 bronzes (28 medalhas), posição repetida em Sidney, apesar do número menor de medalhas (26 medalhas). Na Grécia, o país terminou em 14º, com 14 ouros, 12 pratas e 7 bronzes (33 medalhas).

O aproveitamento midiático da paralimpíada de 2004 merece ser mencionado, já que também é um marco no paradesporto. Foram 168 horas de transmissão pelo canal Sportv (canal a cabo ligado à Rede Globo de Comunicação) e a cobertura de mais 13 canais, divulgação que possibilitou ao povo brasileiro um contato maior com esse universo, o entendimento do esporte paralímpico e, principalmente, a percepção de sua importância, tanto social, quanto esportiva.

Mas talvez a maior contribuição de Vital para o paradesporto tenha sido a criação das Paralimpíadas Escolares, em 2006. O evento une escolas de todo o país, fazendo com que o trabalho de base se desenvolva. Mais do que isso, a competição ajuda na multiplicação do conhecimento, facilitando a capacitação de profissionais para trabalhar com crianças com deficiência. Em Pequim, na China, o Brasil já dava mostras de que se tornaria uma potência paralímpica, conquistando 47 medalhas, sendo 16 de ouro, 14 de prata e 17 de bronze, e terminando pela primeira vez entre os dez primeiros colocados, mais precisamente na 9ª colocação.

Atualmente o CPB é presidido por Andrew Parsons, eleito em assembleia geral por aclamação em fevereiro de 2009, e reeleito em 2013, com mandato até 2017. Foi na gestão dele que o Brasil conquistou o 7° lugar em Londres, em 2012. Andrew começou cedo a vivenciar a realidade do esporte paralímpico no Brasil. Em 1997, recém-formado em jornalismo, ingressou no CPB como estagiário na área e, desde então, foi crescendo na instituição. Tornou-se responsável pelo Departamento de Comunicação e, depois, convidado pelo ex-presidente Vital, foi secretário-geral por 8 anos, entre 2001 e 2009, ano em que foi eleito presidente do CPB para seu primeiro mandato.

Sob seu comando, as Paralimpíadas Escolares tornaram-se o maior evento para crianças com deficiência no mundo. Foi implantada também a Academia Paralímpica Brasileira, voltada ao conhecimento, ciência e tecnologia, e criado o Conselho de Atletas, com poder de voto na eleição para a presidência do CPB.

Se considerarmos todo o ciclo paralímpico, desde 2012 até as paralimpíadas do Rio, Andrew teve à sua disposição cerca de R$ 400 milhões, provenientes não apenas da Lei Agnelo/Piva, responsável por 30% desse montante, como ainda do patrocínio da Caixa Econômica Federal (mais 30%), além de outros 30% em convênios firmados junto ao Ministério do Esporte, 8% da parceria com o governo do Estado de São Paulo e ainda 2% da parceria com a prefeitura do Rio de Janeiro.

ASSOCIAÇÃO DESPORTIVA PARA DEFICIENTES (ADD)

A história da Associação Desportiva para Deficientes, a ADD, na verdade começou bem antes de sua fundação em 1996, na cidade de São Paulo. Tudo teve início em 1993, quando Steven Dubner, professor de Educação Física, retornou de um período após 7 anos trabalhando com esporte adaptado nos Estados Unidos. O Brasil ainda estava restrito a algumas modalidades e poucos profissionais especializados, e Steven chegou trazendo a experiência de novas técnicas para a prática dos esportes adaptados, algumas modalidades ainda inéditas no país, como o Goalball, e muitas inovações que contribuíram para o desenvolvimento do paradesporto e que são utilizadas até hoje. Ele tinha o objetivo de disseminar sua experiência e conhecimentos adquiridos no exterior e, para isso, sentiu que seria necessário criar uma entidade que pudesse potencializar, profissionalizar e promover a cultura desses esportes.

Steven já tinha a ideia de trabalhar nessa área, quando, por intermédio de seu pai, Martin Dubner (in memoriam), ele conheceu Eliane Miada, então gerente administrativa de uma empresa da área de segurança, de que seu pai era cliente. Na ocasião, Steven queria muito viabilizar os projetos que já tinha em mente e estava pensando até em voltar aos Estados Unidos, pois tinha muita dificuldade para encontrar clubes que topassem trabalhar com esse público. Foi nesse momento que o papel de Eliane se tornou fundamental para viabilizar os ideais de Steven, criando uma instituição que tivesse essa especialização.

E assim surgia a ADD, com a missão de profissionalizar o esporte adaptado no Brasil, captar recursos e desenvolver parcerias para a sustentabilidade dos clubes que trabalhassem no segmento, a fim de oferecer condições para o desenvolvimento dos atletas com deficiência, inicialmente na modalidade de basquetebol em cadeira de rodas.

Depois do período inicial em que a ADD atuou no segmento fazendo parcerias para ganhar experiência, surgiu a oportunidade, já no ano seguinte, em 1997, de incentivar a fundação do Clube de Desporto Magic Hands, garantindo um suporte financeiro para a equipe. Nos anos seguintes, a ADD trabalhou fortemente na captação de recursos para manter a rotina de treinamento do time e também incentivar seus participantes à prática de outras modalidades, como a natação, o atletismo e o halterofilismo.

Vale destacar aqui uma ação que ajudou significativamente a dar visibilidade ao tema, conseguida pela insistência de Steven junto à rádio CBN. Foi aberto um espaço para que Steven falasse diariamente sobre esportes adaptados para o público em geral e também empresários potencialmente interessados em apoiar essa causa. Depois dessa experiência bastante enriquecedora, a ADD decide criar, em 2001, um projeto próprio para a iniciação de 10 crianças no esporte adaptado, o Projeto Crianças. Com essa iniciativa surgiu a primeira equipe infantil de basquetebol em cadeira de rodas do Brasil, um dos marcos mais importantes da ADD em toda a sua história e que revelou talentos paralímpicos na modalidade de basquete em cadeira de rodas, como Paola Klokler e Geisa Vieira (Londres 2012).

Foi também nessa época que a instituição fez uma parceria com o Pueri Domus, em São Paulo, para utilizar o espaço da escola para o treinamento de sua equipe de basquetebol infantil. A aceitação desta iniciativa foi tamanha que, em pouco tempo, os alunos sem deficiência da escola foram incluídos aos treinamentos e passaram a jogar com as crianças da ADD, passando a vivenciar toda a experiência de conviver com a diversidade. “O projeto era maravilhoso. Passamos cerca de 3 meses preparando a dinâmica de integração das crianças com e sem deficiência, fazendo palestras e reuniões com professores, pais e alunos. Depois desse período a empolgação era tanta que tivemos de comprar mais cadeiras de rodas para que todos pudessem jogar”, lembra Steven, ainda muito orgulhoso desta época marcante para a ADD. Além disso, foi durante o desenvolvimento desse projeto que foi criada a primeira cadeira de rodas infantil para a prática do basquetebol. “Os alunos do Colégio Pueri Domus e ADD desenharam um protótipo da cadeira que foi levado à Jaguaribe, fabricante de cadeira de rodas. Eles compraram a nossa ideia e produziram um modelo que ainda era inédito no Brasil”, complementa Steven.

Em 2002, a ADD decide ampliar o escopo de sua atuação e cria o Programa ADD Training, que oferecia cursos gratuitos profissionalizantes, para que pessoas com deficiência pudessem ingressar no mercado de trabalho. “Nosso foco inicial era oferecer esses cursos de capacitação aos atletas com deficiência que já treinavam com a ADD. Mas nós não paramos por aí. Fomos pioneiros ao abrir essa possibilidade para pessoas com deficiência que trabalhavam nas ruas, vendendo balas” conta Steven.

Com o patrocínio de diversas empresas, a instituição passou a ampliar essa iniciativa para que essas pessoas pudessem estudar e posteriormente ingressassem no mercado de trabalho formal. “Nosso trabalho também consistia em conscientizar os empregadores sobre a importância de contratar pessoas com deficiência. Nós inclusive criamos uma campanha, feita pela DM9, em que fazíamos uma alusão aos mais influentes empresários do mundo, que trabalham horas e horas sentados. Então, por que não contratar um cadeirante?” lembra Eliane. Essa campanha, inclusive, ganhou um Leão de Ouro em Cannes pela abordagem criativa e muito contundente.

A principal vocação da ADD, no entanto, continuava sendo o esporte. Com o amadurecimento e profissionalização da entidade foi possível, então, implantar um modelo profissional da gestão dos projetos que proporcionasse o incentivo à prática de outras modalidades, tais como voleibol paralímpico, ciclismo e bocha, além da natação, atletismo e o próprio basquetebol em cadeira de rodas. A ADD também incentivou uma outra modalidade esportiva, ainda nova no país. O ciclismo para cegos chamado Tandem, no qual o atleta com deficiência visual compete em uma bicicleta dupla, acompanhado por um guia no banco da frente, que vai dando a direção.

Mas foi por meio da modalidade basquetebol em cadeira de rodas, especificamente com a equipe Magic Hands, que o trabalho da ADD ganhou força e visibilidade. O Magic Hands foi a primeira equipe profissional da modalidade, graças à iniciativa de profissionalização promovida pela ADD, a partir de recursos recebidos de patrocinadores como VR Alimentação, Cassio, Ipiranga e a agência de publicidade DM9. Houve um salto qualitativo na apresentação da equipe, tanto em competições e equipamentos, quanto na formação de equipes multiprofissionais e recursos para viagens, alimentação e hospedagem para os atletas. Esse modelo influenciou outras equipes do Brasil a seguirem o mesmo caminho.

Ao trabalho iniciado pelos fundadores, no sentido da profissionalização da modalidade, foi agregada a visão de uma nova metodologia para o desenvolvimento de atletas. A intenção era torná-los melhores tática e tecnicamente, para que passassem a integrar as seleções brasileiras, explica Sileno Santos, técnico da equipe desde 2003. Com a participação de diversos profissionais foram incluídos novos métodos de treinamento, como musculação periodizada e análise de vídeo, além de intercâmbios profissionais nos Estados Unidos e Europa. Vale ressaltar também que a equipe Magic Hands foi a primeira equipe brasileira a jogar com equipes da NBA em cadeira de rodas, o Magic Orlando, Miami Heat e o New York Knicks.

Todo esse avanço implicou na adoção de novos meios pedagógicos de ensino, bem como à cobrança de postura profissional dos atletas, que até então estavam mais habituados à prática voltada ao lazer e à inclusão, do que para os requisitos necessários ao alto rendimento. Devido à necessidade de reformulação da equipe e implantação da nova filosofia de profissionalismo e treinamento de rendimento, foram investidos recursos nas categorias de base e formação de atletas. Crianças, jovens e adolescentes passaram a ser treinados nas turmas da modalidade na Escola de Esporte. No entanto, devido à falta de equipes na cidade de São Paulo, nem todos os jovens formados eram absorvidos, fazendo com que a ADD formasse uma segunda equipe de basquetebol, o Magic Wheels, em 2008.

O trabalho realizado no Magic Hands o levou a ser uma das principais equipes da modalidade no país, com a conquista de três campeonatos brasileiros (2010, 2011 e 2014) e dois campeonatos paulistas (2009 e 2014), além de honrosa participação no Sul-americano de Clubes em 2012, onde conquistou o 3° lugar. Atletas importantes foram base para a formação do Magic Hands, como Fábio Souza, Valdir Moreira, Fabio Ricci (in memorian) e José Vicente, entre outros.

Em 2016, a expectativa da ADD é ver jovens atletas que treinam nas equipes defendendo a seleção. Em abril, cinco atletas do Magic Hands, entre eles Daniel Ribeiro e Pedro Vieira, vindos da equipe infantil da ADD, foram convocados e pré-selecionados para representar o Brasil nos jogos Rio 2016. Isso representa o esforço de todo um sistema que se iniciou na gestão da ADD, passando pela filosofia de treinamento e formação de atletas até chegar ao alto desenvolvimento esportivo de novos valores para o basquetebol em cadeira de rodas.

A atuação da ADD dentro do cenário paradesportivo brasileiro pode ser observada em diversas modalidades e também no desenvolvimento de projetos que têm como objetivo principal, o fomento ao esporte para crianças e jovens com deficiência. Desde a sua fundação, Steven e Eliane sempre acreditaram no sonho de potencializar, profissionalizar e promover a cultura do esporte para as pessoas com deficiência. “Acreditávamos, e hoje com mais força ainda, que o esporte é uma fonte de motivação para o desenvolvimento de competências, melhora a autoconfiança e proporciona a oportunidade de sociabilização” conta Steven. Em inglês, a palavra “ADD” significa somar e é exatamente isso que a associação está fazendo com os projetos que facilitam o processo de integração e inclusão da pessoa com deficiência na sociedade, por meio de práticas esportivas adaptadas e cursos de capacitação.

Além de oferecer modalidades competitivas, a ADD incentiva um trabalho de iniciação esportiva que é pioneiro no Brasil: o Programa de Iniciação ao Esporte Adaptado. Ele consiste em descobrir talentos e formar atletas, e assim contribui com o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes com deficiência, estimulando a independência e fortalecendo a autoestima nessa fase importante do desenvolvimento.

Essa iniciativa, pioneira no Brasil, teve início no ano de 2001 e destinava-se essencialmente à prática do basquetebol em cadeira de rodas. Aos poucos, outras modalidades foram incluídas, como a natação e o atletismo. Na natação o projeto proporcionou a descoberta de um dos melhores atletas do Brasil, o nadador paralímpico Daniel Dias, que iniciou no projeto e que segue representando a ADD nessa temporada 2015/2016.

A experiência adquirida durante nove anos de trabalho no Projeto Crianças ampliou o conhecimento dos aspectos fundamentais sobre o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, motivando assim a criação do Projeto ADD Escola de Esporte Adaptado. Foi uma iniciativa decisiva na forma de olhar para o paradesporto infantil e juvenil.

Além do trabalho específico vinculado ao esporte, os participantes também tinham acesso a atividades pedagógicas para auxílio no processo de desenvolvimento. O sucesso obtido nos dois anos da ADD Escola de Esporte Adaptado atraiu a atenção de empresas e instituições que atuam neste segmento e trouxe mais visibilidade e credibilidade para a iniciativa.

Em 2012, o projeto foi contemplado na Seleção Pública de Projetos Esportivos Educacionais para patrocínio da Petrobras, através do Programa Petrobras Esporte & Cidadania. O Programa da Petrobras visava promover o desenvolvimento do esporte e sua democratização no acesso à população, como ferramenta de desenvolvimento humano, inclusão social e construção de cidadania. “O patrocínio da Petrobras foi fundamental para darmos continuidade ao projeto de forma sustentável, beneficiando diretamente a crianças e adolescentes com deficiência e outras, indiretamente”, diz a presidente da ADD, Eliane Miada. Foi também graças ao patrocínio da Petrobras que, a partir de 2014, o projeto para crianças transformou-se em um programa de iniciação ao esporte adaptado. O programa, que atende crianças, adolescentes e jovens, conta com metodologia própria e está pronto para ser replicado onde se fizer necessário, explica Sileno Santos, coordenador do programa.

Dentre tantas pessoas, entre colaboradores e atletas com deficiência que passaram pela ADD durante todos esses anos, Eliane faz questão de fazer uma menção especial a um deles, nesse breve resumo da história da entidade. “Paulo de Almeida é uma figura que representa muito bem todo esse espírito e missão da ADD. Ele está conosco desde o início da instituição, onde começou como atleta, e agora atua como conselheiro esportivo”, conta Eliane. Hoje com 48 anos, Paulo teve seu pé direito esmagado no dia 31 de dezembro de 1997, enquanto trabalhava em uma empilhadeira que caiu sobre o membro, causando a amputação imediata. Já no ano seguinte, em 1998, passou a frequentar e defender a ADD, onde encontrou total apoio financeiro e esportivo para desenvolver sua fantástica carreira dentro do esporte, especialmente em provas de longa distância.

Apesar de ter iniciado suas atividades na natação e em corridas de velocidade (100 e 200 metros rasos, tendo sido pré-selecionado para a Paralimpíada de Sidney 2000), foi nas provas de longa distância que ganhou fama internacional. Participou da maratona de Nova York (EUA) de 1999 a 2013, tendo vencido a prova na sua categoria por 5 vezes. Também acumula vitórias nas maratonas de Chicago (EUA), São Paulo e Blumenau (SC), entre outras. Mas foi na ultramaratona Comrades, prova de 89,6 quilômetros, realizada na África do Sul, que Almeida superou a si próprio, tendo sido um dos três amputados a completar a prova, no mundo. Almeida correu a prova em 2001 e 2007, quando conseguiu finalizar o percurso em 10h56min. Em 2014, disputou sua última maratona, em Copenhague (DIN). Depois dessa competição, aposentou-se e passou a trabalhar no conselho desportivo da ADD, onde é responsável pela descoberta e iniciação de dezenas de atletas na modalidade de atletismo, como Alan Fonteles e o mais recente atleta em formação paradesportiva, Vinícius Rodrigues.